Uerj lança edital de concurso docente com metodologia inovadora de reserva de vagas adequada à legislação estadual

10/11/202514:52

Diretoria de Comunicação da Uerj

A Uerj abriu seu primeiro edital de concurso com sistema de reserva de vagas para professores adequado à legislação estadual, marcando o início da implementação de uma política efetiva de ações afirmativas no corpo docente da instituição. As inscrições para as 16 vagas de professor adjunto da Escola Superior de Desenho Industrial (Esdi) da Uerj, sendo 10 para Arquitetura e Urbanismo e 6 vagas para Design, seguem abertas até o dia 21 de novembro, representando um novo marco histórico para a Universidade, que foi pioneira no Brasil na adoção de cotas para discentes em 2003.

Segundo a superintendente de Equidade Étnico-racial e de Gênero (Supeerg) da Uerj, Patrícia Santos, a grande inovação desse concurso é uma metodologia que inclui a aglutinação de cargos docentes e a flexibilidade na alocação das vagas reservadas. “Até agora, os certames eram sempre unificados por departamento, oferecendo poucas vagas. Isso impossibilitava o cumprimento da legislação estadual, que determina entre 5% e 20% das oportunidades reservadas a cotistas. As porcentagens dependem do tipo de cota. Para se chegar a 20% nas cotas raciais, por exemplo, seria preciso que um concurso oferecesse 21 vagas”, explica.

“Por isso, nós entendemos que, para cumprir a legislação, as vagas precisariam ser aglutinadas. Elaboramos um barema [tabela de critérios de pontuação usada em processos seletivos] que será aplicado ao final do concurso, dando oportunidade para todos fazerem a prova em qualquer área, inclusive os de perfil cotista”, enfatiza Patrícia.

Já o vice-reitor da Uerj, Bruno Deusdará, reforça a abrangência do sistema. “Em cada especialidade, poderão concorrer candidatos da ampla concorrência, à cota étnico-racial, à cota PCD e à cota de hipossuficiência econômica”, sintetiza.

Urgência de reparação histórica

Dados estatísticos do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) revelam a dimensão do desafio e a necessidade da medida. Enquanto nos números do Censo 2022 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) 58% da população fluminense se autodeclara negra (42% pardos e 16% pretos), as estatísticas do Censo da Educação Superior de 2022, organizado pelo Inep, mostram que na Uerj 69% dos docentes se autodeclararam brancos e apenas 16% se autodeclaram negros (12% pardos e 4% pretos).

O “Relatório Consolidado sobre a Composição Étnico-Racial e de Pessoas com Deficiência do Corpo Docente da Uerj”, elaborado pela Esdi no primeiro semestre de 2025, alerta sobre a discrepância na composição étnico-racial do corpo docente da Universidade. Esse mesmo relatório aponta que os dados consolidados pelo Núcleo de Informação e Estudos de Conjuntura (Niesc) da Uerj demonstram a sub participação no quadro docente de pessoas com deficiência. Do total de docentes da Universidade, apenas 1,7% registrou ser uma pessoa com deficiência, em contraste com os 7,4% de PCDs dentro da população do estado, segundo o Censo 2022 do IBGE.

Para a diretora da Esdi, Zoy Anastassakis, as cotas para pessoas em situação de hipossuficiência econômica, PCDs e grupos raciais são fundamentais para diversificar o corpo docente, criando um ambiente mais inclusivo para os estudantes. “Embora a Uerj tenha salas de aula diversas há mais de 20 anos, devido às políticas de cotas na graduação, essa realidade ainda não se reflete no quadro de professores. Os estudantes convivem com colegas de diferentes origens, mas não encontram essa mesma diversidade entre os docentes”, destaca.

Ela considera que, apesar de este primeiro movimento não garantir imediatamente a diversidade desejada, ele representa um passo crucial. “Os estudantes poderão testemunhar o esforço da Universidade em trazer para a sala de aula professores que também ingressaram por ações afirmativas, criando referências importantes e fortalecendo o compromisso com a inclusão em todos os níveis da instituição”, conclui.

Testemunhando a importância histórica da iniciativa, Maria das Graças Ferreira, vice-diretora da unidade, conta que, após ingressar na Esdi em 2015, foi durante dez anos a única professora negra, situação que só mudou em 2024 com a chegada de mais um negro para o cargo de docente. “Esse concurso representa um marco crucial para a inclusão étnico-racial e ficará registrada na história da Uerj, tendo a Esdi como a primeira unidade a propor e implementar concretamente um concurso docente unificado com políticas de inclusão”, celebra.

Sistema inovador de aplicação

O modelo adotado pela Uerj, de acordo com Patrícia Santos, incorpora experiências de outras instituições, como a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e a Universidade Federal da Bahia (UFBA), criando um sistema híbrido que prioriza a efetividade das cotas. “Nós analisamos essas duas experiências, olhando para o que cada uma tinha de potencialidades”, complementa.

A implementação do sistema resultou de um esforço coordenado entre diferentes unidades administrativas da Universidade. Estiveram envolvidos no trabalho a Superintendência de Equidade Étnico-racial e de Gênero (Supeerg), o Núcleo de Informação e Estudos de Conjuntura (Niesc), a Coordenação de Avaliação e Acompanhamento Docente (Caadoc), a Procuradoria-Geral (PG-Uerj), a Superintendência de Gestão de Pessoas (SGP) e a Comissão Permanente de Carga Horária e Avaliação Docente (Copad).

Essa elaboração coletiva, segundo o coordenador técnico de Concursos Públicos (Coordcon) da SGP, André Portugal, é um dos principais ganhos do processo. “Acredito que esse concurso representa um grande desafio, mas todo o esforço coletivo realizado servirá de base para a criação de manuais e para aprimorar as práticas da Universidade, em especial da SGP”, opina. Para ele, a experiência com a Esdi permite estabelecer um modelo para futuros certames.

Patrícia Santos considera que a iniciativa representa o início de uma transformação mais ampla e duradoura na composição do corpo docente da Universidade. “A base dessa proposta é a possibilidade de cumprir a legislação, além da sua capacidade de transformação”, conclui.

Fundamentação legal

O sistema está amparado no Parecer nº. 190/2023 da Procuradoria Geral da Uerj, que analisou detalhadamente a viabilidade jurídica de aglutinar vagas de diferentes especialidades. A medida se baseia nas Leis Estaduais fluminenses nº. 6.067/2011 (cotas para negros e indígenas), nº. 2.298/1994 (pessoas com deficiência) e nº. 7.747/2017 (hipossuficiência econômica), atendendo também à determinação do Supremo Tribunal Federal (STF) na ADC nº. 41 de 2017, que reconheceu a constitucionalidade das políticas de ação afirmativa em concursos públicos.

Com esta medida histórica, a Uerj não apenas reafirma seu compromisso com a inclusão e diversidade, mas também estabelece um novo paradigma na composição do seu corpo docente, enquanto mantém sua trajetória como instituição pioneira na democratização do acesso ao ensino superior.