Diretoria de Comunicação da Uerj
Em cerimônia realizada nesta quarta-feira (28) no Teatro Odylo Costa, filho, campus Maracanã, a ministra dos Povos Indígenas, Sonia Guajajara, se tornou a primeira indígena a receber o título de Doutora Honoris Causa da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj). A honraria reafirma o compromisso da Uerj com a reparação histórica aos povos originários e a valorização de sua cultura, bem como o reconhecimento à dedicação da ministra às causas de justiça social, preservação ambiental, igualdade, direitos humanos e defesa de direitos territoriais.
A reitora Gulnar Azevedo e Silva destacou a trajetória inspiradora da ministra e lembrou que a Universidade conta com 38 estudantes indígenas ativos e ingressantes por meio das cotas socio-raciais, distribuídos em 24 cursos. “Tenho certeza de que nossos estudantes têm muito a aprender com você pela sua força. Reconhecemos que os povos indígenas brasileiros, de norte a sul do país, são produtores de conhecimento, de saberes e de práticas de cultura. Na nossa Universidade, entendemos que esse saber é parte viva da nossa história e do nosso futuro, e fundamental para a pluralidade e para a construção de uma sociedade mais justa em um país livre e soberano”, argumentou.
Em seguida, o professor aposentado da Faculdade de Educação José Ribamar Bessa, criador em 1992 do Programa de Estudos dos Povos Indígenas da Uerj, apresentou um resumo das ações e políticas da Universidade relacionadas aos povos originários e exaltou a história militante de Sonia. “Senhora ministra, podemos afirmar que o seu título de Doutora Honoris Causa era imprescindível por duas razões. Primeiro, pelo tratamento que a Uerj vem dispensando nos últimos 33 anos às culturas e línguas indígenas e, segundo, pela trajetória de vossa excelência no cenário nacional e internacional”, comemorou.
A cerimônia contou ainda com apresentações musicais dos corais Altivoz e do Núcleo de Envelhecimento Humano, ambos da Uerj, e do coral indígena Guarani da Aldeia Mata Verde Bonita, formado por alunos da Escola Municipal Indígena Guarani Para Poty Nhe’ Ë Já, de Maricá (RJ).
A construção da Amazônia pelos povos originários

Em seu discurso, Sonia Guajajara destacou a relevância de ser homenageada por uma universidade tão distante geograficamente do lugar onde nasceu, o Maranhão. “Esta distância reforça a potência desse gesto. Ele rompe fronteiras e reafirma que o conhecimento é também movimento. Ser homenageada com o título de Doutora Honoris Causa por esta instituição, referência no saber, na formação crítica e a primeira do Brasil na adoção de políticas de cotas raciais e sociais, é antes de tudo um reconhecimento à trajetória coletiva dos povos indígenas do Brasil e do mundo”, destacou.
Sônia traçou um paralelo entre diversas construções milenares de civilizações indígenas reconhecidas internacionalmente e a importância dos povos originários brasileiros para a Amazônia. “Assim como os maias e astecas ergueram pirâmides, os povos indígenas brasileiros moldaram a Amazônia. Ela não é uma floresta virgem, mas sim uma obra viva, manejada ao longo de milênios, com sistemas agrícolas complexos, aldeamento de espécies e engenharia ecológica sofisticada, como o manejo e a produção da terra preta. Tal como as pirâmides são reconhecidas como maravilhas do mundo, a Amazônia deve ser vista como um monumento à inteligência e à resiliência indígena, tecido em biodiversidade e conhecimento sustentável, assim como todos os outros biomas do Brasil”, afirmou a homenageada.
Importância da representatividade
Emocionada, a aluna indígena do quinto período de pedagogia da Uerj Maria Raíssa Tabajara homenageou Sonia Guajajara com um buquê de flores. Ela destacou a importância do título concedido à ministra para a visibilidade, acesso e permanência de alunos indígenas. “Esta cerimônia é importante para enfatizar os nossos direitos, a nossa ancestralidade e podermos inclusive conquistar melhorias aqui dentro da Universidade”, pontuou Raíssa.
Martinha Guajajara, mestre em Educação pela Faculdade de Formação de Professores (FFP) da Uerj e diretora da Escola Municipal Indígena Guarani Para Poty Nhe’ Ë Já, apontou que, para os alunos ali presentes, é muito importante ver uma representação indígena ocupando lugares de visibilidade e de poder. “Isso potencializa uma perspectiva de futuro para os nossos jovens, por demonstrar que nós ainda estamos aqui, ocupando diversos contextos, e que de fato contribuímos para uma forma mais justa de existência neste planeta”, finalizou.
Trajetória
Nascida em 1974 na Terra Indígena Arariboia, no Maranhão, com origem no povo Guajajara/Tentehar, Sonia Guajajara é uma das mais importantes lideranças indígenas do Brasil. Deixou sua terra natal ainda jovem para estudar e se formou em Letras e em Enfermagem pela Universidade Estadual do Maranhão (Uema), onde também se especializou em Educação Especial. Em sua trajetória de militância, atuou na Coordenação das Organizações e Articulações dos Povos Indígenas do Maranhão e na Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab).
Em maio de 2024, foi eleita para a Presidência do Conselho Executivo do Fundo para o Desenvolvimento dos Povos Indígenas da América Latina e Caribe (Filac). Sonia tornou-se a primeira brasileira a presidir a entidade, formada pelos países da América Latina e também por Portugal, Espanha e Bélgica.
Ao longo de sua carreira, conquistou reconhecimento pela atuação política e social. Em 2018, foi candidata à vice-presidência do Brasil pelo PSOL, ao lado de Guilherme Boulos, e em 2022 foi eleita deputada federal por São Paulo. No mesmo ano, integrou a equipe de transição do governo Lula e, em 2023, foi nomeada como a primeira ministra dos Povos Indígenas do Brasil.
Seu trabalho e seu ativismo lhe renderam prêmios e homenagens fora do país, incluindo os títulos de “uma das 100 pessoas mais influentes do mundo” pela revista norte-americana Time, em 2022, e “uma das 100 mulheres mais inspiradoras do mundo” pela inglesa BBC, em 2023.
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