Viagem de campo à Amazônia inspira produção audiovisual de alunos do Instituto de Geografia da Uerj

07/08/202510:37

Diretoria de Comunicação da Uerj
Professor Beser (ao centro, de camisa branca) e equipe ao pé de uma sumaúma, árvore gigante da Amazônia

Estudantes do Instituto de Geografia (Igeog) da Uerj conheceram a maior floresta tropical do mundo em trabalho de campo da disciplina “Geografia da Amazônia”. Entre os dias 30 de maio e 8 de junho deste ano, 40 alunos percorreram mais de 6.500 quilômetros, atravessando quatro estados (RJ, SP, MS, MT) e três biomas diferentes (Mata Atlântica, Cerrado e Amazônia), com o intuito de observar, in loco, os conhecimentos adquiridos e debatidos durante o curso.

Líder da expedição, Leandro Andrei Beser, professor do Departamento de Geografia Física, relata a experiência. “Em sala de aula, tratamos dos diferentes ciclos amazônicos e os conflitos desencadeados por eles, desde o ciclo da borracha até a pecuária, a chegada dos grandes empreendimentos energéticos e minerais e o avanço da soja. Foi possível observar a intensidade desses processos e o desencadeamento deles na vida dos agentes que compõem esse espaço. Tais processos estudados foram, ao longo do campo, se confirmando pelos encontros realizados com diversas esferas da região amazônica. Essa vivência gerou questionamentos, reflexões e emoções”, conta Beser, também coordenador do Núcleo de Estudos Geográficos (Negeo).

Dessa imersão resultaram diversos materiais produzidos pelos alunos: os documentários “Vivências amazônicas: entre lutas e amores” e “Entre a selva e o ser: as diferentes Amazônias em relatos”; o story map “Amazônia em disputa: vidas, territórios e resistências” e a página Ambiente em Luta, no Instagram. A exposição fotográfica “Vivências amazônicas: entre lutas e amores” está aberta para visitação no hall do Programa de Pós-graduação de Geografia (PPGEO), localizado no 4º andar do bloco F, campus Maracanã.

Já o podcast “Diálogos Amazônidas” deverá ser lançado em breve também na plataforma Spotify. Todos os materiais produzidos estarão disponíveis para consulta de toda a comunidade acadêmica e externa para que todos possam acessar os conteúdos e embarcar na jornada pelas diversas Amazônias, uma referência à obra do geógrafo Carlos Walter.

Apresentação dos trabalhos no PPGEO

Na tarde do dia 17 de julho, foi realizado o II Encontro de Geografia da Amazônia: de volta ao campo, no auditório 4.006F do PPGEO. Com o tema “Em busca das Amazônias: olhares, vivências e saberes”, os estudantes do Igeog apresentaram seus trabalhos desenvolvidos após a expedição amazônica. A aluna Hamine Arbex, do 11º período, esteve à frente da produção do story map, ferramenta interativa que permite a combinação de mapas com narrativas, textos, imagens, vídeos e dados geográficos em formato de história. Ela se deparou com alguns momentos de choques culturais, mesmo em grupo grande, vindo do Sudeste. Apesar do desafio de convivência, conta que foi bem recebida junto com os seis colegas de grupo e como essa experiência modificou sua visão de mundo.  “Essa oportunidade me inspirou a pesquisar a Amazônia a fim de somar às denúncias que a população sofre com os impactos do agronegócio, a mergulhar nas histórias de pessoas que nos receberam com todo o carinho, mesmo o mundo tendo sido cruel com eles”, diz.

“Repensei a realidade da insegurança alimentar no Brasil e os impactos dos empreendimentos energéticos. A mudança de perspectiva que tive nesse trabalho de campo com certeza me transformou por inteiro. Espero poder retribuir esse investimento na nossa formação por meio do meu trabalho acadêmico e atuação profissional, em busca de trazer à luz essas questões”, acrescenta Hamine.

Locomotiva aquática com membros da expedição adentrando a floresta amazônica

Produtor do documentário “Entre a selva e o ser: as diferentes Amazônias em relatos”, Matheus Nicacio, do 8º período, buscou mostrar o antes e depois das visões de cada estudante em relação à Amazônia. Para ele, a maior dificuldade da expedição foi tornar a viagem viável para todos os seus colegas, mas surpreende-se em seus aprendizados além da esfera acadêmica. “Diante de um desmonte que a educação pública vem sofrendo nos últimos anos, o maior desafio estava presente antes de a viagem acontecer. O contraste entre o imaginário amazônico e a realidade impactada pelo agronegócio, além da força de resistência que pulsa na região, me ensinaram mais sobre empatia, escuta e compromisso social do que qualquer sala de aula poderia oferecer. A vivência de campo não apenas ampliou minha formação enquanto geógrafo, mas moldou minha sensibilidade como ser humano”, destaca Nicacio.

A página Ambiente em Luta, recém-criada no Instagram pelo aluno Rodrigo Fernandes, traz relatos, fotos e reflexões da Amazônia enquanto território de vidas, culturas e conflitos. Dentre tantos relatos, o que mais sensibilizou o futuro geógrafo foi sobre o assentamento do Projeto de Desenvolvimento Sustentável (PDS) São Paulo, localizado em Carlinda (MT). “Ouvimos as histórias da Dona Antonia e do Seu Zé da Lasca, que ainda sofrem com a pressão do agronegócio no entorno, inclusive com aeronaves que despejam agrotóxicos próximos ao terreno deles, causando alergias e problemas de saúde. Esse trabalho de campo serviu pra reforçar a minha busca pessoal por um mundo melhor, usando a Geografia como ferramenta”, reflete Fernandes, que sonhava viajar para a Amazônia desde 2022.

COP30 trará olhares internacionais para a Amazônia

Em 2019, foi realizada a primeira viagem de campo à região amazônica em um contexto marcado pela retomada das atividades da Uerj após uma crise intensa. A iniciativa da imersão ocorreu na ocasião em que o professor Leandro Beser lecionou, pela primeira vez, a disciplina Geografia da Amazônia, com enfoque nos conflitos ambientais e nas disputas territoriais. Nos seis anos que separam as duas expedições, Beser destaca algumas mudanças presenciadas por ele, que já morou no Acre há alguns anos.

Expedição da Uerj visita Usina Hidrelétrica de Sinop (MT)

“Na primeira viagem, nos concentramos no município de Alta Floresta e no entorno. Já neste ano, vivemos outro cenário. Do ponto de vista pedagógico, houve um notável aprimoramento: conseguimos aprofundar a abordagem sobre os conflitos socioambientais, o que em 2019 ainda acontecia de forma mais espontânea, construída ao longo da própria experiência. Em 2025, planejamos com mais intencionalidade as estratégias de observação e análise dos conflitos, incluindo a visita a uma usina hidrelétrica e às áreas impactadas por ela — o que permitiu compreender diferentes perspectivas envolvidas nesses processos”, relata.

No ano em que o país sediará a 30ª Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas de 2025 (COP30), Beser avalia a visita do Igeog à Amazônia de forma positiva. “A Amazônia está no centro das discussões sobre mudança do clima, justiça ambiental e os rumos do planeta. Produzir conhecimento comprometido com as realidades locais, dar visibilidade às vozes silenciadas e oferecer uma formação crítica e sensível aos nossos estudantes são formas de contribuir, mesmo que de forma indireta, para os debates que estarão no centro da COP-30”, argumenta.

“Mais do que uma atividade didática, essa viagem foi um exercício de escuta, de presença e de valorização dos saberes locais e ancestrais. É justamente isso que esperamos ver refletido em agendas específicas da conferência: um olhar atento à pluralidade de Amazônias que compõem o território brasileiro, reconhecendo que a resposta aos desafios climáticos e ambientais passa, necessariamente, pelo respeito à diversidade social, cultural e ecológica da região”, finaliza.