CAp-Uerj celebra 40 anos do Clube de Leitura investindo em memória e na nova geração de leitores

01/02/202317:41

Diretoria de Comunicação da Uerj

Há quatro décadas, surgia o embrião de um projeto transformador do Instituto de Aplicação Fernando Rodrigues da Silveira (CAp-Uerj). A professora Leila Medeiros de Menezes reunia os alunos das turmas 311 e 312 e fundava o Clube de Leitura, lugar para questionar, dar asas à imaginação, fazer descobertas e ampliar horizontes dos estudantes.

Em um desses encontros, uma pergunta feita à sombra de uma mangueira ganhou papel de destaque na história do colégio. Durante debate sobre liberdade, pautado pelo livro em discussão no clube, um dos participantes questionou: como seria possível falar do assunto quando as aulas eram realizadas em salas cercadas de grades nas janelas?

Paula Saldanha e Leila Menezes

Desde então, o projeto passou a ocorrer ao ar livre, até ganhar, em 20 de maio de 1982, um espaço próprio, personalizado pelos estudantes. Em votação, eles escolheram Paula Saldanha para dar nome ao clube. Na época, a jornalista apresentava o “Globinho”, programa de TV com foco no público infantil, muito popular junto à garotada.

“Ao chegar ao CAp-Uerj em 1978, a professora Leila Menezes, com toda a sua vivência em salas de aula do município do Rio de Janeiro, em um contexto histórico de silenciamento do regime militar, buscou investir na leitura contra esse cenário de apagamento da vontade e da expressão dos estudantes”, explica a coordenadora pedagógica Camila Gigante.

Quatro décadas depois, o Clube de Leitura segue forte como parte do currículo educacional e sua história se confunde com a do próprio Instituto de Aplicação.

Formação de leitores

Desenvolvido junto às turmas dos 4º e 5º anos do ensino fundamental, o Clube de Leitura Paula Saldanha promove seus encontros semanalmente, como parte obrigatória do currículo. E se apoia no desejo dos alunos por autores ou obras. “Nossa intenção com a disciplina é a formação de leitores, o que envolve diferentes significações. Entendemos a leitura como produção cultural”, acrescenta Camila Gigante.

A introdução dos estudantes ao mundo da literatura é potencializada com o trabalho interdisciplinar. Um livro pode virar o tema de um projeto de artes, por exemplo, ou ainda ser transportado para as aulas de Português e ser usado como inspiração para a criação de poemas.

Camila também detalha que, após 40 anos, o clube ganha novos papéis, com crianças sendo apresentadas cada vez mais cedo à tecnologia e suas influências. “Padrões sociais acabam se intensificando na cultura infantil. A leitura e seus desdobramentos são formas de evidenciar e reafirmar as individualidades de formação dos estudantes por meio da imaginação e compreensão e – por que não? – por meio da poesia”, acrescenta.

Porém, os recursos eletrônicos não são inimigos: ela revela que smartphones e computadores podem se somar como auxiliadores da exploração dos livros físicos. “O celular, por exemplo, serve como instrumento de leitura e acesso à informação. O notebook e o projetor nos permitem compartilhar audiolivros e contações de histórias com imagens. Entendemos que a tecnologia, se usada de forma proveitosa, é uma importante aliada em nosso cotidiano”, explica.

A professora Claudia Andrade, que assume o Clube em 2023, também acredita que os dispositivos não são empecilho para a introdução à leitura. “As crianças continuam curiosas sobre o mundo. Ler um livro para eles é abrir um leque de possibilidades. Não percebo os dispositivos eletrônicos como rivais diretos se a aula consegue atrair o olhar e o desejo. Precisamos nos manter antenados todo o tempo para atiçar as referências e construí-las”, observa.

Outra atividade do projeto são as expedições, quando os estudantes visitam locais históricos que, até então, só haviam sido apresentados por obras textuais. As viagens para fora da cidade tornam o Clube de Leitura uma experiência mais imersiva e sensorial. “Alguns exemplos de expedições que fazemos são ao centro histórico do Rio de Janeiro, Vale do Paraíba e Paraty. Com a vivência, compreendemos que a produção do conhecimento pode se tornar muito mais significativa, prazerosa e potente, favorecendo a alfabetização do olhar e criando sentidos para a leitura e a escrita”, exemplifica Camila.

Há também o Café Literário, em que os estudantes têm a oportunidade de interagir com um autor e tirar dúvidas sobre a construção da história. É uma experiência complementar, aproximando mais os pequenos leitores do ambiente literário e saciando a curiosidade que um livro pode despertar nessa idade. Como dizia a professora Leila, ser criança é “se apropriar da realidade para interpretá-la e vivê-la de forma intensa, transformando-a, a partir da criação de mundos e de personagens. É fazer. É brincar. É sentir. É tornar-se pessoa. É pura poesia”.

Momentos para a vida toda

O Clube de Leitura é tão marcante para os alunos que muitos ainda recordam dos momentos vividos, décadas depois. É o caso de Bruno Deusdará, hoje professor da Faculdade de Formação de Professores e diretor do Centro de Educação e Humanidades da Uerj, que participou do projeto há 31 anos.

“Guardo até hoje muitas e intensas lembranças de minhas experiências no Clube de Leitura, organizado pela querida Tia Leila. Se as tardes no Clube nos despertassem para a curiosidade pela leitura de livros diversos, já seria uma grande conquista acadêmica. Mas tinham significado maior para nós, desejávamos contar histórias, encená-las. Me lembro de uma atividade de produção dos nossos próprios livros, com ilustração, reflexão sobre seu tamanho, forma”, conta Bruno.

Já Samuel Levy, ex-estudante da turma de 2001, revela o impacto da atividade para sua formação como leitor: “Lembro como se fosse hoje quando começamos a ler juntos Harry Potter, sucesso da época. O resultado é eu ter me tornado um leitor assíduo e levado esse hábito comigo até hoje”, conta ele, que também teve a oportunidade de conviver com a fundadora do projeto. “Tive aula com a própria Leila. É um espaço que muda a vida de um aluno”, completa.

Resgate da história

Novo espaço do Clube de Leitura

Em uma nova sede desde o ano passado, o CAp-Uerj conta agora com um prédio bem maior, capaz de oferecer melhor infraestrutura para todas suas atividades. Isso também significa que o Centro de Memória, Pesquisa e Documentação (CMPDI) foi ampliado.

Exposição realizada em janeiro resgatou grandes momentos do Clube de Leitura, e foi o pontapé inicial de uma linha de atuação expandida do CMPDI. Com a finalização das obras na sede do CAp, as perspectivas futuras incluem receber pesquisadores externos e também ampliar estrutura para armazenamento do arquivo. “A ideia é que esse local se constitua de fato como espaço de pesquisa, inclusive dando continuidade à organização do acervo e de sua digitalização”, explica Andrea Fernandes, coordenadora do núcleo.

O Centro de Memória vai abrigar também a história do colégio que funcionou, até 2019, no atual endereço do CAp-Uerj, o Instituto Padre Leonardo Carrescia.